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Digitalização é o futuro para os Correios de Cabo Verde

A pandemia deixou Cabo Verde isolado do mundo e provocou quebras acentuadas nas receitas dos Correios de Cabo Verde. Isidoro Gomes, PCA daquela instituição, fala sobre as soluções encontradas para combater esse isolamento e dos investimentos feitos com os olhos postos no futuro.

De que forma é que a distribuição de correio em Cabo Verde foi afetada pela pandemia?

Extremamente. Em 2020 a quebra do tráfego postal registou uma quebra acima de 60%. Nós funcionamos no conceito das três pernas. Uma perna na origem, os Correios responsáveis pela receção, uma segunda perna que é da responsabilidade do sector de transporte marítimo ou aéreo e uma terceira perna, portanto que são os Correios que recebem o correio de destino. Nós trabalhamos na última perna. Ora, tomando o ano 2019 como ano modelo, nesse ano cerca de 65% do tráfego postal era tráfego inbound, ou seja, correio internacional com uma incidência maior, portanto na Ásia, concretamente China, Malásia e Singapura. Entrando da China em confinamento, não podemos esquecer que a primeira zona do Globo que entrou em confinamento foi precisamente a China, e estamos a falar de finais de 2019 e início de 2020. Automaticamente os Correios de Cabo Verde começaram a sentir esse bloqueio. Depois de as coisas terem melhorado na China, entrou a Europa em confinamento. Ora todas as correspondências provenientes do estrangeiro com destino a Cabo Verde, mais de 90%, passam pelas fronteiras europeias, com incidência em França e Portugal. Como sabemos, ainda no primeiro trimestre de 2020 todos os países europeus estavam em confinamento e nós estávamos bloqueados. Obviamente que esse bloqueio internacional teve uma consequência direta no tráfego com destino a Cabo Verde. O que tentámos fazer foi arranjar algumas compensações internas e minimizar os estragos também na nossa comunicação com o mundo. Daí termos feito uma parceria muito inteligente com o grupo ETE e que nos permitiu de alguma forma dar vazão aos correios estacionados em Portugal com destino a Cabo Verde e vice-versa. Passámos de correio aéreo para correio marítimo. Internamente, dentro daquilo que foi possível, tentámos maximizar o tráfego – é curioso que o correio interno aumentou em 2020 – mas infelizmente continuamos muito dependentes do correio internacional e quando há uma situação como a pandemia que fecha o mundo os Correios de Cabo Verde automaticamente ressentem-se.

Esses atrasos que foram causados pela pandemia já estão recuperados?

Já estão, diria, mais de 60% recuperados. Um dado engraçado: só em março de 2021 recebemos cerca de três toneladas de correio enviados dos Estados Unidos da América em 2020 e que se encontravam retidos na Europa. Portanto, neste momento não temos atrasos de correios nos maiores países emissores de correio para Cabo Verde. A situação está normalizada, nós tememos é que a situação venha piorar na Europa e eventualmente também na Ásia, porque poderá causar uma nova complexidade aqui aos Correios de Cabo Verde e essencialmente aos destinatários desses correios. O que nós garantimos é que do lado dos Correios temos tudo operacional, a nossa máquina está oleada. Tivemos muitos investimentos dentro da máquina operacional da empresa, precisamente para facilitar e agilizar toda a componente de entrega e distribuição das correspondências e tudo aquilo que passa pelo sector postal.

O comércio eletrónico veio dar uma revitalização ao sector dos Correios. Como é que vocês estão a gerir tudo isto?

Existem quatro macrotendências para o sector postal a nível mundial e uma dessas tendências é precisamente a digitalização. Aliás, nos últimos anos a União Postal Universal (UPU) tem incentivado as operadoras postais a abraçarem o fenómeno do comércio eletrónico enquanto alternativa, enquanto nova área de desenvolvimento do sector postal, mais não seja enquanto fator compensatório da quebra do correio tradicional. Mais uma vez acho que, no atual contexto, o ano que podemos tomar como sendo exemplar é 2019. Nesse ano os rendimentos da empresa cresceram acima de 50%, a exploração do serviço postal contribuiu com mais de 40% da nossa estrutura de rendimentos. Ora se mais de 60% nosso tráfego é tráfego considerado comércio eletrónico obviamente que cerca de 29% dos nossos rendimentos eram provenientes diretamente da exploração do comércio eletrónico. Portanto, os Correios de Cabo Verde têm exemplo que chegue de que, efetivamente, o comércio eletrónico é um mar de oportunidade para nós. Primeiro devido à nossa diáspora, segundo devido a, infelizmente eu felizmente, uma forte dependência do país no que respeita à importação, terceiro o facto de sermos ilhas. Nós entendemos que existem aqui duas grandes oportunidades: uma oportunidade de fora para dentro e de dentro da fora, ou seja, inbound e outbound com a diáspora e uma segunda oportunidade interna, a nível doméstico. Nós acreditamos que Cabo Verde só terá um verdadeiro sistema de comércio eletrónico se os Correios assumirem esse compromisso. Não na perspetiva de exploração, mas na perspetiva de intermediação. Nós entendemos que os Correios devem funcionar numa espécie de mercado onde aqueles que compram e aqueles que vendem se encontram e fazem as suas transações em segurança e os Correios garantem tudo aquilo que tem a ver com a logística: fazemos a recolha, o tratamento, o transporte e a entrega em segurança. Mas para isso é preciso que haja iniciativa legislativa que crie, de facto, tudo o que tem a ver com o princípio e com o modelo de comércio eletrónico nacional. É preciso que as partes interessadas deem o seu contributo para o seu funcionamento. É preciso que tenhamos um sistema de transporte eficaz e previsível e é preciso que haja ferramentas online que permitam às pessoas fazerem essas transações.

Como será essa plataforma que os Correios querem desenvolver?

Estamos a falar de uma plataforma que permite que haja crescimento interno e também que haja um crescimento externo, mas na perspetiva de exportação. Porque se é verdade que com o comércio eletrónico inbound os Correios ganham dinheiro por ser intermediário, a verdade é que quanto mais dinheiro sai do país é o mercado de divisa que fica desequilibrado. Portanto, acho que, além da estratégia empresarial, do ponto de vista de aumentar as suas receitas e rentabilidade os Correios também devem estar imbuídos de uma estratégia de fazer com que a economia no seu todo cresça. Cresce a exportação, cresce a economia e que, em último caso, impacte o PIB nacional.

A nível de volume de negócios o comércio eletrónico atualmente significa quanto para os Correios de Cabo Verde?

Não temos os dados fechados a nível de 2021. Mas 2020 paradoxalmente, para os Correios a nível mundial e principalmente nos países desenvolvidos foi um ano regular, foi um ano de crescimento. Ao passo que os Correios subdesenvolvidos, permita-me a expressão, foi um ano de aproveitamento quase nulo. Todos os Correios que fizeram, antes de 2020, investimento no comércio eletrónico recuperaram-no no ano passado. No nosso caso, como nós não fizemos nada, não recuperámos nada. Assim, em 2020 não temos nada a reportar, porque como eu disse inicialmente o nosso comércio eletrónico é essencialmente inbound. Como 2020 foi um ano praticamente fechado os dados são quase insignificantes com exceção do último trimestre onde começámos a ter alguma retoma, algumas luzes, essencialmente de correios provenientes da China, mas também tinham sido compras feitas muitos meses atrás e que estavam com delay considerável. Em 2021 começamos a ter já a retoma. Ainda não estamos ao nível de 2019, mas verifica-se um aumento do tráfego postal. Mas eu diria que neste momento olhando para as características do tráfego postal diria que, no nosso volume de negócio, o comércio eletrónico representa entre 10 e 12%.

Quanto às remessas de dinheiro do exterior através dos vossos serviços. Esse serviço tem vindo a crescer?

O melhor ano, desde que iniciámos esse serviço em Cabo Verde, foi no ano passado. Aliás, o melhor mês foi maio, muito justificado pelo pico da pandemia. A crise sanitária ajudou a aumentar as remessas através das várias plataformas eletrónicas de envio de dinheiro. Mas hoje já não podemos falar apenas de remessas, porque muitos empresários lá fora e não só utilizam as plataformas dos Correios para fazer atualizações entre empresas. Há muito dinheiro que vem de fora, que vem via Correios e não via banca. Para dar um exemplo, em 2020, o Money Gram teve crescimento de 53%. É brutal. Só no Money Gram transacionamos perto de seis milhões de contos em 2020. Nós acreditamos que esse crescimento vai continuar tendo em conta os investimentos que estão sendo feitos, não só a nível da comunicação e imagem, mas acima de tudo das novas políticas comerciais e de imagem que a Money Gram está a definir, neste momento, com foco nos países remetentes de dinheiro para Cabo Verde.

 

Dezembro 2021

Expresso das Ilhas

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